O título completo do livro escrito pelo advogado (de profissão) e músico e compositor (por vocação) argentino Enrique Strega, destaca também: “Uma História de Vinícius a Piazzolla”.
Lançado em português pela Editora Argentina Corregidor, com duzentas e vinte e uma páginas, o livro curiosamente tem pequenas falhas na tradução, interessantes e até engraçadas sob certo aspecto, mas que não tiram a beleza e a complexidade do estudo sério e determinado feito pelo autor, um apaixonado pelas músicas da Argentina e do Brasil.
A idéia para escrever o livro unindo os dois países e os dois gêneros, surgiu quando Strega leu a biografia do músico argentino Astor Piazzolla, escrita por María Suzana Azzi e Simon Collier e numa frase pode notar a admiração e a paixão do genial bandoneonista pela música brasileira e pelo Brasil, onde ele encontrou respeito e reconhecimento pela música de vanguarda que sempre executou. E curiosamente, ele teve mais destaque aqui no Brasil do que na própria Argentina. Sua música de vanguarda rompeu diversos paradigmas e como nossos “hermanos” são muito conservadores e tradicionalistas, sua música que literalmente transformou o Tango tradicional, ganhou naturalmente mais espaço em outros territórios.
Naquela leitura Enrique Strega marcou o ponto de partida da sua jornada e teve ali a inspiração para que pudesse mergulhar fundo na sua pesquisa para traçar um paralelo entre as duas culturas e as suas musicalidades, curiosamente interligadas.
Ele constatou muitas coincidências entre a Bossa Nova e o Novo Tango, como as críticas que surgiram quando do surgimento de ambos os movimentos, seus vínculos inegáveis com o Jazz, a postura política e a condição social dos seus criadores e a prova desse vínculo está marcada na forte e intensa amizade que uniu o nosso querido poetinha Vinícius de Moraes (que neste ano de 2013 completa cem anos de nascimento) e Astor Piazzolla e é flagrante que esta admiração mútua foi transmitida para seus seguidores através dos anos.
Na primeira parte do livro ele descreve “Os Movimentos”, detalhando os cenários históricos de Brasil e Argentina, “Que isso é Bossa Nova, que é muito natural”, a renovação na música popular argentina, as semelhanças e diferenças entre a Bossa Nova e o Novo Tango, a influência do Jazz e também a política e a arte.
Na segunda parte ele destaca “Os Encontros”, citando a nova musa da Bossa Nova (Maysa Matarrazzo em 1961 levou para Buenos Aires Roberto Menescal, Bebeto Castilho, Hélcio Milito e Luiz Carlos Vinhas, que logo depois disso criaram o incrível Tamba Trio. Na oportunidade eles foram apresentados como Os jovens de Copacabana e pode ser considerada como a primeira saída internacional dos protagonistas da Bossa Nova), a presença de João Gilberto em Buenos Aires (sua primeira visita foi no ano de 1962, meses antes da memorável apresentação do movimento no Carnegie Hall de Nova York), o carioca portenho, como era conhecido Vinícius de Moraes (que se apresentou pela primeira vez em Buenos Aires no ano de 1968), Tom Jobim na Feliz em Mar Del Plata (Feliz é o apelido carinhoso dado aquela cidade argentina e Tom Jobim por lá se apresentou em 1978) e o Novo Tango no Brasil (o autor descreveu que o Brasil, sua gente, sua música, provocaram uma fascinação particular nos músicos argentinos e Astor Piazzolla viveu esse encanto com paixão. E por aqui ele teve encontros e momentos inesquecíveis).
Por todo esse conteúdo aqui apresentado resumidamente, recomendo a leitura do livro que está recheado de grandes histórias descritas por quem realmente as viveu e que fortalecem ainda mais a importância dos movimentos da Bossa Nova e do Novo Tango.
O filme de Walter Lima Jr., lançado em 2008 conta a trajetória de vida de quatro amigos músicos, Rodrigo Santoro, Jair Oliveira, Ângelo Paes Leme e André Moraes e mais um amigo, Selton Mello, um aspirante de cineasta, que tinham o sonho de ganhar o mundo, mais precisamente a América e tocar no mítico Carnegie Hall de Nova York.
Trata-se de uma obra de ficção ambientada no início dos anos sessenta, bem no início da Bossa Nova e vendo o filme podemos notar algumas homenagens feitas a alguns dos maiores nomes do gênero. Um filme feito nitidamente com o coração e que retratou com fidelidade uma época histórica do nosso país, tanto no cenário musical, social, político e econômico.
O que mais chama a atenção no filme é a belíssima trilha sonora, lançada pelo selo Dubas e que contou com composições, arranjos e direção musical do genial do pianista Wagner Tiso. Muito inspirado, ele participou ativamente da trilha, colocando toda a sua sensibilidade musical e muito romantismo à disposição da história e das imagens do filme. Uma verdadeira declaração de amor a Bossa Nova.
Destaco os temas “Quero Você” em duas versões com “Os Desafinados” e na bela voz de Branca Lima, “Miranda” com a surpreendente interpretação do ator Rodrigo Santoro, “Jazz New York”, “A Estátua da Liberdade”, a inusitada versão de “Take The A Train/Só Danço Samba”, o clássico “Carinhoso”, todas estas com Wagner Tiso, “Meditação” e “Caminhos Cruzados” com Branca Lima e para encerrar “Desafinado” com Os Desafinados. Um time de músicos da pesada fez parte da “cozinha”, extremamente afinada e integrada. Trilha sonora de primeira.
Postado em: 28/01/2013
Deixe um comentário. É importante o preenchimento de todos os campos.